terça-feira, 7 de março de 2017

Entre penas e cetros

Jogou o peso de seu corpo pra cima e subiu na mesa. Agarrou-se com força às grades e fitou o horizonte. Tantos telhados bonitos pareciam existir, mas aquele, justamente aquele que ficava a sua frente, era velho, parecia gasto e as telhas estavam enegrecidas.

O céu estava limpo e vez ou outra um passarinho cortava sua visão, seguindo seu destino, e ela sentia tanta inveja. Ele sabia pra onde ia. Pra onde devia ir. Vislumbrou os cachos vermelhos caídos sobre sua face e pensou por dois segundos se eles poderiam ser trançados. Jogados daquela varanda para que o príncipe subisse e a salvasse. Que ele lhe desse um motivo pra ter passado tanto tempo esperando. Que ele lhe dissesse que ela tinha achado algo que acabaria com todas as suas dúvidas e incertezas. Riu amarga dos próprios pensamentos. Seu cabelo mal alcançava seus ombros, quem dirá cinco metros a baixo. E ela não era uma princesa esperando ser salva. 

Ela era uma jovem mulher/garota normal esperando algo de extraordinário acontecer. Mas ela ao menos saberia dizer o que era extraordinário. Encontrar alguém? Arranjar o emprego de seus sonhos? Com o que exatamente ela sonhava? Se um dia ganhasse asas, pra onde voaria? Pra onde essa pequena grande ave de penugens vermelhas e olhos escuros direcionaria seu bico? Que trilha sonora tocaria em sua mente enquanto ela tentaria se achar? E por que tinha tantas perguntas? Nem pra essa ela sabia a resposta.

Era uma jovem passarinho que sonhava com princesas infantis, ouvia suas trilhas sonoras adolescentes e não tinha a mínima ideia de como entrar em outra fase da vida. Mas ela sabia que queria ser seu próprio príncipe, ela queria se salvar da torre alta e da bruxa que a aprisionava. Essa bruxa talhada entre incertezas e sentimentos ruins. Ela queria ser seu próprio conto de fadas. Olhou da mesa para o chão, e lhe pareceu incrível como aquele menos de um metro parecia tão mais assustador do que a altura que separava a grade de onde seus pés poderiam tocar. Aquela pequena altura significava parar de devanear e continuar perdida. Mas já não estava?


Aquela princesa passarinho voltaria pro seu ninho aguardando o dia em que suas asas soubessem pra onde lhe guiar e o céu não parecesse tão assustador.

Nenhum comentário:

Postar um comentário