segunda-feira, 23 de junho de 2014

No fim da rua

A rua estava escura, deserta, e por mais perigoso que fosse, eu gostava assim. Talvez um pouco de chuva tornasse tudo mais legal. Sim, a chuva, eu queria muito que o céu chorasse. Que ele me ajudasse a chorar também, que suas doces lágrimas levassem as minhas salgadas. Que seu riso descontente me trouxesse paz. Eu andava rápido, mas minha intenção não era, nem de longe chegar rápido em casa. Era deixar pra trás o que me acompanhava, o que vinha em minha mente e eu tentava me livrar.
Apressei o passo. Minha mente me dizia que não ia adiantar. E não adiantava, a cada minuto estava mais forte, mais pulsante ali, dentro da minha cabeça, a verdade que não queria me abandonar. Eu achava levemente injusto, apesar de conhecer o mundo e saber que seus seres eram por natureza mentirosos, sendo gentil, mas eu quis ser sincera, eu quis me abrir, mas esse mesmo mundo me fechou, me manteve num casulo de muros e grades, me mantém segura. A rua parecia mais comprida do que era, mas contraditoriamente, eu tinha e impressão de que seu fim estava próximo. O fim que eu não queria chegar.
Andei devagar, e a verdade me acompanhou, fechei os olhos e tentei não ver. Estava na minha cara, clara como águas de um rio cristalino, como um letreiro em neon de um motel de beira de estrada. Fria, assim como a chuva que não caía, ferina, assim como a arma de um assassino que perambulava pelas ruas à espera da próxima vítima. Ela ia, e eu tentava ficar. Mas não cabia a mim conseguir escapar.
Cada história tem suas variações. Cada verdade tem suas interpretações. Ora, e por que não? Por que não deixar que a vida interprete por mim? Um lado do mundo eu conheço, mas tantas outras faces me são escondidas. A verdade estava ali, cabia a mim despi-la e encontrar minha versão do conto. Um homem de bicicleta passou por mim e me disse algo que não consegui decifrar. Ao notar minha confusão, ele gritou:
-Vá pra casa menina, o mundo é cruel com aqueles que dão a chance.
Era isso que eu tinha que fazer, não dar a chance de o mundo me passar pra trás. Dobrei a próxima esquina, um quarteirão antes do fim da rua, antes da próxima avenida, e, embora eu já tivesse passado da minha casa, me sentia mais segura do que nunca. A rua escura se iluminou um pouco, o frio beijava-me como se quisesse me galantear, e veja só, um pingo de água caiu em minha testa, olhei pra cima e a chuva disparou sua caminhada das nuvens ao solo, do céu ao inferno.

Voltei dois quarteirões e parei no portão da minha casa, ainda conseguia ver o fim da rua, mas a questão é que não precisei chegar lá, não precisei do fim pra achar a saída. E era assim mesmo que eu ia levar, dobrando esquinas até que o fim fosse melhor que a curva.

2 comentários:

  1. Bruna Vieira perderia feio pro seu livro de crônicas. *--*

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  2. Nossa! Sua escrita esta maravilhosa!!! Yohanna, que orgulho! <3

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