sexta-feira, 23 de maio de 2014

Asas de tinta

Certa vez, quando eu era bem pequenininha, me deram um lápis e uma folha de papel, como fazem quando querem entreter as crianças, mesmo que isso queira dizer muitas paredes riscadas. Quando parti dos rabiscos para as letras, entrei em um mundo que não tinha saída, entrei no meu mundo. Foi difícil descobrir que mundo era esse, e porque eu estava nele, foi difícil até descobrir que ele existia, mas eu me toquei.
                Não sei se começou com um poema que o professor passou como atividade de casa, ou em uma história de princesas que escrevi pra minha avó, eu só sei que ali algo nasceu. E aqueles rascunhos viraram mania, aquela vontade de continuar aquelas palavras e nunca mais pausá-las parecia uma coisa normal.
                Aos quinze, entrei de vez, armada com meu caderno e uma caneta, nesse mundo que eu ainda desconhecia. Minha primeira obra, as primeiras lágrimas que recebi, a primeira vez que abri o coração para algo que não poderia me fazer sentir culpada por aquilo, para algo que, eu sabia, começava a amar. A partir daí, foi impressionante como minha mente passou a ver histórias em tudo, em todos, em mim e nos outros.
                Eu descobri nas palavras escritas, o amor que desconhecia nas pessoas, a paixão intensa por algo que não me fazia mal, não tinha olhos azuis ou fama de bad boy. Descobri os amigos que me faltaram na infância, os pais que se ausentaram na vida inteira, a coragem que nunca me visitou. Posso dizer com certeza que eu me encontrei. Descobri coisas sobre mim, uma parte obscura da minha mente que só precisava de um pouco de luz pra se rebelar, uma parte iluminada do meu coração que carecia de um pouco de escuridão para acender. Eu descobri na tinta azul de uma esferográfica, motivos para continuar pintando minha própria tela em branco.
                Quando comecei a escrever, abri minha cabeça para todas as possibilidades possíveis, passei a encarar outras mentes como minhas, a ter que respeitar aquilo que me parecia estranho, comecei a acreditar em mais do que eu sabia, e a desacreditar no que me ensinaram numa vida inteira, lentamente, me dei conta de que quem se apega ao preconceito, tem que se desapegar de muita coisa. E não valia tanto a pena assim conservar velhas ideias. Afinal, era sobre isso, sobre mudar sempre, ser uma pessoa em constante evolução, era sobre ser muitas em uma só.

                Eu descobri um amor em um lápis e uma folha de papel, e quando eu mais preciso de tudo , só isso me basta...

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